A decisão do governo dos Estados Unidos de aplicar uma tarifa de 50% sobre parte das exportações brasileiras tem provocado reflexos em diversos setores da economia nacional.
O anúncio, feito pelo presidente Donald Trump em julho e em vigor desde agosto deste ano, atinge em cheio produtos em que o Brasil tem forte presença no mercado norte-americano, como carne, café e móveis.
De acordo com levantamento do Sindicato da Micro e Pequena Indústria (Simpi), os itens mais exportados para o mercado norte-americano são resinas plásticas, insumos químicos e solventes, com faturamento entre US$ 100 milhões e US$ 150 milhões, o que representa de 12% a 15% das exportações brasileiras para os EUA. Na sequência estão os cafés especiais — em grãos, cápsulas artesanais e outras variações , com vendas de US$ 80 milhões a US$ 120 milhões.
O setor calçadista responde por 6% a 7% das exportações, com valores entre US$ 50 milhões e US$ 80 milhões, enquanto os móveis de MDF e desmontáveis com design brasileiro representam cerca de 5%, somando de US$ 40 milhões a US$ 60 milhões.
Quais elos da cadeia sentem primeiro os efeitos do tarifaço?
Segundo Couri, a cadeia produtiva envolve todos os fornecedores que participam do processo, desde a origem da produção até a entrega do produto final ao comprador, que, por sua vez, coloca esse item à venda para o consumidor. “A interrupção de uma cadeia produtiva ocorre quando uma empresa perde um pedido ou vê seu volume de vendas cair.
O impacto é imediato e se espalha por todos os elos”, afirma. “Transporte, embalagem, fornecedores diretos e indiretos, consumo e empregos são afetados em questão de dias — às vezes, em poucas horas.”
Esse efeito pode ser observado em diferentes setores. No setor têxtil, explica Fernando Valente Pimentel, diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), a reação é em cadeia. “Se a confecção deixa de vender moda praia para os EUA, o fabricante de malha que a abastece também perde, e isso recai sobre fornecedores de fio, fibra e até corantes.
É um efeito em cascata muito grande, porque todos os elos são integrados. Há empresas da moda praia que destinam até 60% do faturamento ao mercado americano, e você não substitui isso do dia para a noite”, diz.
Segundo ele, cada elo depende do anterior e o impacto acontece quase imediatamente. “A confecção é a mais afetada. Depois, o fornecedor do tecido ou da malha, em seguida o fornecedor do fio ou do filamento e, por fim, o fornecedor da fibra.”
No setor de café, o impacto ocorre em etapas, aponta Celírio Inácio, diretor executivo da Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC). “Quem sente mais fortemente são, obviamente, os exportadores e importadores, já que os contratos podem ser cancelados de imediato ou adiados — como vem ocorrendo agora”, afirma.
Em seguida, a logística e os portos registram queda na movimentação, já que há menos cargas para transportar. “Depois, o impacto chega às cooperativas e armazéns, que passam a acumular estoques, elevando custos e pressionando preços. Com o tempo, os produtores rurais também são atingidos, recebendo menos dividendos das cooperativas, o que afeta diretamente sua renda — e, por consequência, a economia das regiões produtoras.”
No caso dos calçados, o impacto é igualmente amplo, observa Haroldo Ferreira, presidente-executivo da Abicalçados. Segundo ele, todos os elos da cadeia de fornecedores — que inclui cabedais, contrafortes, palmilhas, tecidos, laminados sintéticos, solados, saltos e couros — sentem os efeitos. “A cadeia do couro acaba sendo ainda mais impactada, pois a maior parte dos produtos exportados para os Estados Unidos é desenvolvida com esse material”, afirma.
Como os exportadores brasileiros repassam esse custo?
As tarifas alteram negociações e criam instabilidade em toda a cadeia. Empresas que não conseguem absorver o impacto tentam repassar parte do custo aos clientes, seja em reajustes ou em acordos caso a caso.
Segundo Hélder Santos, especialista em Gestão Tributária na Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), é difícil afirmar se a empresa assumirá parte desse custo ou ele é sempre repassado integralmente.
“Depende do caso. Empresas que tinham maior disponibilidade de caixa podem absorver uma parte desse prejuízo. Outras com maior restrição financeira devem repassar integralmente. Ainda é preciso considerar como será o acesso dessas empresas aos pacotes emergenciais do governo federal, que podem oferecer um certo alívio pela oferta de crédito barato.
O presidente do Simpi Nacional observa que a saída, muitas vezes, é dividir o prejuízo. “Não existe um modelo único. Alguns conseguem dividir com o cliente americano, pagando uma parte aqui e outra lá fora. Outros não têm essa margem e acabam dando desconto naquele lote específico, para não perder o negócio. É muito na base da negociação, do olho no olho.”
Segundo ele, o risco é perder espaço para concorrente. “O exemplo mais claro é o das carnes, onde outros países já ocuparam a nossa fatia. Esse é o risco: se não conseguimos encontrar alternativas, alguém vem e toma esse mercado.”
Como PMEs que fornecem para exportadoras ão afetadas indiretamente?
Mesmo sem exportar diretamente, PMEs acabam absorvendo parte da pressão. Grandes companhias exigem descontos e prazos maiores, repassando os efeitos da tarifa para fornecedores menores. “Essas fornecedoras acabam arcando com parte da pressão, já que as grandes empresas repassam exigindo descontos e prazos maiores. É um efeito cascata”, diz o professor da FIA Business School.
Couri alerta que a margem das pequenas indústrias, que já é apertada, fica ainda mais pressionada. “Para quem depende fortemente da exportação, o efeito é imediato, já no primeiro mês.”
O consumidor brasileiro também sentirá os efeitos?
Os especialistas consultados por PEGN concordam que, inicialmente, o efeito do tarifaço deve ser concentrado no mercado externo. No curto prazo, pode haver queda no preço de alguns produtos por aumento de demanda. No longo prazo, os preços internos podem ter algum tipo de impacto — mas ainda é difícil de estimar.
“A redução do volume de exportações brasileiras para os EUA tende a reduzir o fluxo de entrada de dólares na economia, afetando o estoque de moeda americana nos cofres públicos e encarecendo a taxa cambial.
Consequentemente, podemos vivenciar um aumento no custo de importação de insumos, máquinas e equipamentos”, diz o especialista em Gestão Tributária na Fipecafi. Se houver medidas retaliatórias, itens importados dos EUA também podem encarecer.
De acordo com Carlos Pinto, diretor do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), a velocidade do repasse ao consumidor final varia conforme o ciclo de cada produto: enquanto os preços de alimentos e bens de consumo rápido podem subir em até três meses, no caso de automóveis, maquinário e outros bens de ciclo longo os efeitos podem levar até um ano para aparecer.
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